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Faltam opções de empregos qualificados para jovens

Valor Econômico

Escolaridade básica basta em 40% das áreas que mais empregam

Por Lucianne Carneiro — Do Rio

Quatro das dez ocupações que mais empregam jovens no país têm baixa exigência de escolaridade, de apenas o ensino fundamental incompleto. A conta considera o número de jovens em relação ao total de trabalhadores em determinada atividade. Situação semelhante é observada também entre as ocupações com maior número absoluto de trabalhadores entre 15 e 29 anos: quatro entre as dez primeiras têm ensino fundamental incompleto como escolaridade mais frequente. As informações são de levantamento feito pela consultoria IDados para o Valor, a partir de microdados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua referentes ao quarto trimestre de 2021, os mais recentes para o indicador.

Entre as atividades que aparecem no estudo, estão, por exemplo, condutores de bicicleta, trabalhadores de centrais de atendimento e de serviços domésticos em geral e trabalhadores elementares da construção de edifícios.

O retrato coincide com momento em que há um avanço no grau de escolaridade dos jovens brasileiros. Para se ter uma ideia, 14,9% dos trabalhadores entre 15 e 29 anos têm o ensino superior completo, sendo que apenas parte deles teria idade para tal.

Somando-se os 12% de quem tem a formação incompleta, a parcela do ensino superior ultrapassa um quarto dos trabalhadores dessa faixa etária (26,9%). Além disso, são 42,9% com ensino médio completo. A fatia dos que têm apenas até o fundamental completo, por outro lado, é bem inferior, de 17,2%.

Os dados sugerem, segundo especialistas, que os jovens entram no mercado em ocupações que pouco contribuem para o desenvolvimento profissional e que também há um descompasso entre o avanço do grau de instrução dos jovens e as oportunidades oferecidas pelo mercado de trabalho.

“Existem muitos jovens com ensino superior (completo ou incompleto) nessa faixa etária de 15 a 29 anos. Porém, as ocupações que mais empregam jovens exigem em geral menos do que isso, como médio completo e até fundamental incompleto. Esse fato sugere que pode estar havendo descasamento entre a escolaridade do jovem e qualificação exigida pela ocupação”, diz o professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e pesquisador-líder da área de mercado de trabalho da consultoria IDados, Bruno Ottoni, responsável pelo estudo.

O economista esclarece que, longe de criticar as ocupações que aparecem no topo da lista que mais empregam jovens, é preciso avaliar que muitas são atividades que dão poucas oportunidades de progressão para os jovens, comprometendo o futuro profissional.

“Todo trabalho é digno, mas a questão é que tipo de trabalho o mercado está conseguindo oferecer para os nossos jovens. São trabalhos em que se vê perspectiva de longo prazo? São trabalhos em que vão conseguir aproveitar a escolaridade? Nossos jovens estão em ocupações que são ótimas do ponto de vista de trabalho, mas em geral não oferecem perspectiva de carreira de longo prazo”, nota ele, acrescentando: “Temos jovens mais qualificados, mas há uma característica estrutural do mercado de trabalho brasileiro que hoje não está conseguindo gerar empregos melhores para esses jovens.”

Junto com a menor exigência de escolaridade, o perfil das ocupações apresentado no estudo é também de remunerações mais baixas e maior instabilidade, destaca o professor da Faculdade de Economia da Universidade Federal da Bahia (UFBA), Stélio Coêlho Lombardi Filho. Tradicionalmente, diz ele, os jovens têm menos experiência e acabam tendo que se submeter a essas vagas com menores exigências, geralmente em setores como serviços e comércio, além de apoio administrativo.

“Com o retorno das atividades, os jovens têm conseguido encontrar postos disponíveis. Mas em geral essas ocupações têm muita instabilidade e rotatividade alta. Elas têm qualificação exigida baixa, mas em compensação também com retorno baixo”, explica ele, que também é pesquisador do grupo de pesquisas em economia do trabalho da UFBA. Lombardi alerta para as consequências: “Muitas vezes esse jovem consegue superar a barreira do primeiro emprego, mas quase sempre está numa situação de instabilidade que impede ele de fazer uma transição para a vida adulta, de ter autonomia para formar sua família.”

Apesar de enfrentarem normalmente maiores obstáculos para a inserção no mercado de trabalho por causa da falta de experiência, os jovens tendem a sofrer mais em momentos de crise como o atual. Lombardi diz que os empresários costumam reduzir a disposição ao risco e, portanto, a contratar profissionais que exijam maiores investimentos de treinamento. O professor cita o chamado “efeito cicatriz”, que costuma marcar a trajetória profissional de quem chegou ao mercado em momentos de crise.

“Essa configuração das ocupações que mais empregam jovens reflete não só o momento ruim da economia como um todo, mas também o fato de os jovens serem um grupo muito sensível no mercado de trabalho. Já é um grupo com maior rotatividade, têm taxa de desemprego maior, salário menor, estão mais no mercado informal. Eles aceitam até porque precisam ganhar experiência”, corrobora a professora da Universidade Estadual Paulista (Unesp), Solange Ledi Gonçalves.

Na avaliação dela, há neste momento um aumento do descompasso entre o grau de instrução de jovens e a qualificação das vagas disponíveis no mercado de trabalho, o que compromete a capacidade de crescimento profissional dos jovens, como já mostraram trabalhos científicos sobre o assunto.

“Papers mostram que, ao aceitar vaga que não é condizente com seu nível de escolaridade, o jovem pode ter dificuldade maior de conseguir crescer no mercado de trabalho depois, pode impactar na progressão de carreira. Por exemplo, se tem ensino superior, mas entrou trabalhando em rede de ‘fast food’, pode ter mais dificuldade depois de conseguir vaga de analista júnior, que é mais condizente com o ensino superior, porque ficou aquele tempo ali”, diz.

https://valor.globo.com/brasil/noticia/2022/04/26/faltam-opcoes-de-empregos-qualificados-para-jovens.ghtml

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