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Revisão de normas trabalhistas vai trazer mais segurança (José Pastore)

Em lugar de facilitar o ambiente de negócios, a máquina administrativa do Brasil tende a gerar muita insegurança para os agentes econômicos. No campo do trabalho, a insegurança decorre principalmente de portarias, memorandos, instruções normativas, notas técnicas e outros atos infralegais confusos. É fato conhecido que a regulamentação das leis é o momento em que os maus burocratas procuram se vingar dos legisladores…

Um artigo recentemente publicado pelo Ipea (Bruno Dalcolmo e colaboradores, Simplificação Normativa Trabalhista, Ipea: Mercado de Trabalho, março 2021) informa que mais de 2 mil normas infralegais do extinto Ministério do Trabalho estão sendo revistas com o propósito de dar a necessária orientação para quem tem de segui-las. São normas superadas, ininteligíveis e até contraditórias. Cito alguns exemplos.

Fiquei surpreso ao saber, por exemplo, que o Conselho Nacional do Trabalho (CNT) foi criado pelo presidente Arthur Bernardes por meio do Decreto 16.027 de 1923. O Conselho foi recriado inúmeras vezes sem a revogação do decreto de origem, o que só ocorreu em 2019 com o Decreto 9.757.

Totalmente ultrapassado é o Decreto 1.232 de 1962, assinado pelo primeiro-ministro Tancredo Neves que proíbe o trabalho noturno às aeroviárias, ainda em vigor, e em choque com o artigo 5.º da Carta Magna.

Mais esdrúxula ainda era a Portaria 656 de 2018 que regulamentava a Lei 3.857 de 1960, que exigia dos músicos estrangeiros o recolhimento ao sindicato dos músicos de 10% dos ganhos obtidos em apresentações realizadas no Brasil. O recolhimento foi obrigatório até a sua anulação pelo Supremo Tribunal Federal em 2019.

Normas complexas, superadas e desencontradas fazem lembrar a descrição de Caio Prado Jr. a respeito da administração dos tempos do Brasil Colônia: “… a complexidade dos órgãos, a confusão de funções e competências; a regulamentação esparsa, desencontrada e contraditória que a caracterizava, (era acompanhada) por uma verborragia abundante em que não faltavam até dissertações literárias… na monstruosa, emperrada e ineficiente máquina burocrática que foi a administração colonial” (Formação do Brasil Contemporâneo, edição 2008, pág. 333).

Nas últimas décadas, o Ministério do Trabalho foi objeto de indecorosas barganhas políticas com ministros indicados pelo PT, PTB e PDT que lotearam as diversas secretarias para partidos coligados como o PCdoB, PCB, Solidariedade e outros. Cada secretaria criava suas próprias normas como se fossem capitanias de propriedade dos secretários. A impessoalidade da burocracia weberiana passou longe. Transparência nem pensar. Ao contrário, quanto mais obscuras as normas, maior era a possibilidade de vender facilidades – literalmente.

Ministros foram afastados por suspeita de corrupção; outros foram impedidos de tomar posse por decisão judicial; processos de improbidade se multiplicaram, e mesmo assim os infratores continuaram com seu balcão de negócios. Getúlio Vargas criou um sindicalismo que era apêndice do Estado, e os últimos ministros, com raras exceções, o fizeram dependente dos partidos políticos.

Em boa hora tudo passou para o Ministério da Economia. Seus técnicos estão ultimando uma revisão detalhada das referidas normas, colocando-as em capítulos acessíveis por meios digitais, o que muito ajudará os atores do mundo do trabalho. A revisão demandará ajustes. Mas o principal já foi feito.

  • PROFESSOR DE RELAÇÕES DO TRABALHO DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO E MEMBRO DA ACADEMIA PAULISTA DE LETRAS. É PRESIDENTE DO CONSELHO DE EMPREGO E RELAÇÕES DO TRABALHO DA FECOMERCIO-SP

O ESTADO DE S. PAULO

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